A infecção pelo vírus da Zika é uma doença transmita pelo mosquito Aedes Aegypti e que ganhou grande destaque desde sua epidemia nas Américas, ao final de 2015. A doença durante a gravidez foi associada a microcefalia, levando a Organização Mundial de Saúde a declarar uma emergência de saúde pública internacional em 2016. Entretanto, apenas 13% dos fetos infectados nascem com microcefalia, a maioria deles não apresenta sintomas ao nascer. Essas crianças infectadas ainda no ventre da mãe, hoje possuem cerca de 3 anos de idade, por isso, ainda não se sabe que complicações a longo-prazo a infecção pelo vírus da Zika no ínicio da vida pode trazer. Da mesma forma, também não é sabido se as crianças nascidas sem sintomas ainda estarão em risco de desenvolvimento de danos neurológicos tardiamente.

Para responder a essas questões, um grupo brasileiro liderado pela profa. Julia R. Clarke, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, infectou camundongos no início da vida com um vírus isolado de um paciente no Recife/PE, e os acompanhou enquanto cresciam. Para o desenvolvimento do cérebro, os primeiros dias após o nascimento de um camundongo são equiparáveis aos últimos meses de gravidez em seres humanos.

Paula Frost, do NeuroPod, é autora deste trabalho e explica:

“Os camundongos infectados com o vírus da Zika apresentaram microcefalia pós-natal, além de frequentes crises convulsivas na infância e maior risco a convulsão quando adultos.  Mesmo na idade adulta, a replicação viral ainda estava presente. Isso levou a anormalidades cerebrais, incluindo morte de neurônios, tamanho diminuído e calcificações no cérebro.”

Como é de se esperar, essas deformidades prejudicaram a memória, capacidade motora e sociabilidade dos camundongos. Essa descoberta está de acordo com vários relatos de crianças infectadas durante a gravidez – mesmo sem malformações visíveis ao nascimento, as crianças desenvolvem microcefalia, crises epilépticas e danos motores durante a infância.

Considerando o curto tempo desde a epidemia e a falta de conhecimentos sobre o assunto, o uso do modelo animal mostrou-se crucial nessa pesquisa. Por meio desse estudo, podemos antever complicações neurológicas que possivelmente afetarão crianças infectadas durante a gravidez ou logo após o nascimento com o vírus da Zika. O estudo ressalta a importância do acompanhamento continuado dessas famílias, muitas das quais, encontram-se em condições socioeconômicas desfavoráveis.

Por mais assustador que esse cenário possa parecer, o trabalho também trouxe uma possível solução: o uso de um medicamento anti-inflamatório, utilizado no tratamento de doenças autoimunes, preveniu as convulsões de animais infectados. Isso porque o dano cerebral observado é decorrente de uma grande inflamação do sistema nervoso causada pelo vírus. Contudo, esse tratamento não é capaz de prevenir os danos cognitivos e motores. Vale destacar que os resultados em animais são preliminares, o tratamento não deve ser utilizado em crianças ou gestantes.

A imagem abaixo resume os principais resuldados e como a pesquisa foi realizada:

Representacao Souza Frost et al 2018 portugues.001

O trabalho brasileiro publicado na revista científica americana, Science Translational Medicine, chama a atenção para um potencial fardo neurológico nos anos por vir em crianças e adolescentes expostos ao vírus da Zika na última epidemia durante a gravidez ou logo após o nascimento. Ele também destaca a necessidade de se continuar estudando essa doença e suas consequências.

Fonte: Souza et al., Science Translational Medicine  06 Jun 2018:
Vol. 10, Issue 444, eaar2749
DOI: 10.1126/scitranslmed.aar2749

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