O uso excessivo de álcool pode apresentar consequências graves para o desenvolvimento de um bebê. E isso é altamente difundido. O consumo de álcool durante a gestação não é recomendado por médicos, por afetar diretamente a criança em desenvolvimento. Porém a maioria dos avisos é focada no lado materno do consumo alcoólico a longo prazo e a ciência afirma que o lado paterno também possui influência no processo.

Estudos que observam a prevalência do alcoolismo na população mostrou um caráter hereditário. Gêmeos idênticos nascidos de pais alcoólicos demonstraram igual tendência ao consumo exagerado de álcool – independente do meio em que cresceram. Além disso, filhos de pais alcoólatras demonstraram uma menor sensibilidade ao álcool do que um indivíduo comum, o que poderia levar ao consumo excessivo. Mais uma vez sugerindo um fator genético.

Quando se aumentava o escopo da pesquisa para entender as alterações cerebrais que filhos de pais alcoólatras estariam sujeitos, se observou uma maior prevalência de doenças psiquiátricas.

No conjunto esses estudos sugerem que o consumo excessivo de drogas como o álcool pelo lado paterno possui sérias consequências para seus filhos. E essas consequências mostravam um caráter genético – independente do meio. Estudos utilizando modelos animais entram para se compreender exatamente como isso ocorre.

Para isso, pesquisadores administram álcool em doses diárias a camundongos machos. Em seguida, o colocam para acasalar com uma fêmea que nunca teve contato com a substância e os filhotes são coletados para uma série de investigações comportamentais. Os filhotes demonstraram um comportamento mais ansioso e impulsivo do que um grupo de camundongos controle. Além disso, os animais possuíam dificuldade em seu aprendizado espacial ao longo do desenvolvimento, com dificuldades de localização espacial quando adultos. Mas como que o consumo de álcool paterno poderia levar a alterações comportamentais?

O cérebro dos filhotes encontravam anormalidades em seu DNA, alterações conhecidas como epigenética. O que seria isso? Nosso DNA tem o poder de expressar qualquer gene em nosso corpo. Afinal, células de sua pele possuem o mesmo DNA que células de seu olho, fígado, coração – apesar de terem funções completamente distintas. É aí que entra a epigenética: ela limita e controla o que deve ser expressado pelo seu DNA (figura abaixo). Dessa forma, apesar de terem o mesmo DNA, células de sua pele e do seu olho expressam genes completamente diferentes: levando a alterações em sua função. Na pesquisa das consequências genéticas do consumo alcoólico foram encontradas alterações epigenéticas no cérebro dos filhotes. Essa seria uma hipótese levantada para as alterações comportamentais citadas anteriormente.

 

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A última peça do quebra cabeça foi publicada recentemente em 2018 na revista científica Frontiers in Genetics. Afinal, como o consumo alcoólico paterno levava a alterações no cérebro de filhotes? Camundongos machos foram submetidos ao consumo de álcool e seu esperma foi recolhido para análise. Após alguns testes descobriram que o consumo de álcool alterava o material genético dos espermatozoides desses animais. E isso não é novidade na literatura. Estudos de efeitos do consumo de outras drogas, como cocaína, também mostra alterações no material genético do espermatozoide.

Revisões na literatura cientifica sugerem que esse seria o mecanismo genético: O consumo de álcool levaria a alterações genéticas e epigenéticas no esperma do pai. Essa alteração afetaria o desenvolvimento do filho(a), com alterações epigenéticas e culminaria nas alterações comportamentais.

Em conclusão, não podemos dizer que genes são fatores determinantes para o desenvolvimento do alcoolismo – isso nunca é verdade. Mas dadas as evidências coletadas em estudos com humanos e roedores existe um fator genético que influencia os efeitos deletérios do consumo de álcool.

 

Referências

Heavy Chronic Intermittent Ethanol Exposure Alters Small Noncoding RNAs in Mouse Sperm and Epididymosomes. Front. Genet., 08 February 2018. Gregory R. Rompala, Anais Mounier, Cody M. Wolfe, Qishan Lin, Iliya Lefterov and Gregg E. Homanics

Drinking beyond a lifetime: New and emerging insights into paternal alcohol exposure on subsequent generations. Alcohol. 2015 Aug;49(5):461-70. Finegersh A, Rompala GR, Martin DI, Homanics GE

Créditos da imagem: http://www.doctissimo.fr/html/dossiers/cancer/articles/9594-cancer-alcool-cause-majeure.htm

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